segunda-feira, 24 de junho de 2013

O Livro de Amós: A Denúncia da Injustiça Social. Fernando Henriques - CEBI Méier

CEBI MÉIER
Comunidade Renato Cadore

O Livro de Amós: A Denúncia da Injustiça Social.



Fernando Henriques
coordenador


Eu não sou profeta, nem discípulo de profeta. Eu sou criador de gado e cultivador de sicômoros. Foi Javé quem me tirou de trás do rebanho, e me ordenou: Vá profetizar a meu povo Israel” (Amós 7, 14b-15).


O Livro de Amós é uma grande denúncia da injustiça social. Além disso, é uma crítica à religião que serve de fachada para a injustiça, que acoberta um sistema social iníquo e viciado pela raiz. Lendo o Livro de Amós podemos ter uma ideia do significado e da forma da atividade profética, pois o texto desse profeta é uma verdadeira introdução ao profetismo, com todos os elementos básicos que caracterizam os livros proféticos que surgirão posteriormente (Euclides M. Balancin e Ivo Sorniolo).
A vocação profética de Amós chama a nossa atenção para a liberdade de Deus, que escolhe seus enviados onde ele quer e não apenas onde esperaríamos que escolhesse. Isso mostra a importância de estarmos atentos para ver onde está se manifestando a voz da profecia. A voz que se pretende profética é sempre uma voz libertadora, que desvenda a realidade e aponta caminhos para que o povo tenha mais vida. Tanto sua denúncia como seu anúncio libertam o povo das amarras de uma realidade que o oprime, para construir novos passos na história em direção a uma sociedade mais justa.
Como base para sua crítica profética, Amós recorreu ao acontecimento fundante do povo de Israel: a libertação da escravidão para formar uma nova sociedade em aliança com o Deus justo. Amós denuncia que Israel se esquecera de sua própria história, renegando os valores de esperança e libertação. Não se tratava de mero erro, grande ou pequeno, mas de clara involução. A crítica de Amós, portanto não exige uma reforma qualquer, mas uma retomada fundamental da própria história, produzindo uma conversão no presente ao projeto de Javé.

O cerne de todas as críticas de Amós pode ser resumido num só ponto: a perversão de uma religião que na origem é essencialmente libertadora, para transformá-la em instrumento de opressão. O profeta articula a Palavra de Deus para desmontar essa ordem injusta e trazer novamente a esperança para o povo. Sua firmeza e confiança repousam apenas na certeza que ele percebe através dos grandes atos de Deus na história.
O texto final do livro de Amós (9,11-15) é um acréscimo feito muito tempo depois e se dirige aos judeus exilados na Babilônia. Esse texto final abre perspectivas de esperança para aqueles que foram castigados com o exílio e reconheceram a própria culpa. Redescobre a possibilidade do Dia de Javé como Dia de Luz para todo o povo.
***
Livro de Oséias: Palavra de Javé que foi dirigida a Oséias, filho de Beeri, nos dias de Ozias, Joatão, Acaz e Ezequias, reis de Judá, e nos dias de Jeroboão, filho de Joás, rei de Israel. O século VIII a.C. impressiona pela acumulação, no breve espaço de tempo de meio século, de quatro profetas de grande calibre: Amós, Oséias, Isaías e Miquéias.
No movimento profético temos duas fortes correntes, a israelita e a judaíta. A corrente judaíta apresenta sacerdotes críticos ao Estado (Isaías e Ezequiel). A corrente israelita é mais camponesa e revolucionária (Samuel, Elias, Eliseu, Miquéias, Amós, Oséias, Jeremias).
O Profeta Oséias é do Reino do Norte (Israel) e profetiza entre os anos de 743 e 732 a.C. O nome Oséias significa Deus Salva. Oséias chamará poeticamente o Reino de Israel de Efraim. Ele sucede Amós, após este ter sido expulso do Reino do Norte. Israel possuía à época dois grandes santuários: Betel e Garizim. Foi um período de muitos conflitos internos, ao mesmo tempo em que a profecia cresceu como voz dos espoliados. O Reino de Israel vivia seus últimos anos de independência, pois Samaria, a capital, seria tomada pelos assírios em 722 a. C.
A juventude de Oséias coincidiu com um dos poucos momentos de prosperidade do Reino do Norte. Entretanto essa situação mudou completamente após a morte do rei Jeroboão II (783-743 a.C.). O Reino de Israel decaiu rapidamente devido ao expansionismo do Império Assírio, à fragilidade do poder central e às suas contradições internas. Nunca mais haverá um Reino de Israel.
Oséias é o profeta que sente “as dores do fim” e dará uma certa continuidade à profecia de Amós, acentuando a necessidade de restaurar o culto e a função do templo de Betel como um lugar do verdadeiro culto a Javé.
A não ser que não se trate só de uma parábola, Oséias viveu um drama em sua vida conjugal: a infidelidade da esposa, que se desviou para a prostituição. Apesar disso, o marido continuou a amá-la, e, convertida, acolheu-a novamente. O amor de Oséias, assim fiel e desinteressado, despertou a mulher para o seu valor e ela voltou a ser a esposa. Com isso, Oséias descobriu ser ele dono da força regeneradora do amor. Esta marcante experiência abriu os olhos do profeta para a tragédia de seu povo: amado por Deus, mas infiel. Oséias será o profeta da fidelidade amorosa à Aliança.
O tema central do profeta será claro e preciso: o amor de Deus e o pecado de Israel. O cerne da mensagem de Oséias sustenta que Deus quer Amor e Misericórdia e não sacrifícios. Trata-se de uma virulenta denúncia contra as elites que promoviam a violência e viviam à custa do sangue do povo oprimido, explorando até a sua fé em Deus. A instituição sacerdotal em Betel é diretamente acusada pela profecia de Oséias. Os sacerdotes são especialmente acusados de não instruir o povo, facilitando com que se afastem da Aliança com Javé. De uma certa maneira a classe sacerdotal era reforçada com a multiplicação dos pecados, pois isto também significava mais gastos em sacrifícios. O afastamento do povo de Javé é apresentado pelo profeta como prostituição.
Dentro da dinâmica da Aliança e da necessidade de reatar relações, se poderia resumir a teologia de Oséias nos seguintes pontos:
•        Javé pede divórcio em virtude da corrupção dos líderes religiosos e políticos e se retira de sua presença.
•        Reis e sacerdotes são culpados pela situação do povo.
•        As injustiças sociais ferem o povo e rompem a Aliança.
•        Deus é mãe que alimenta o filho, que tem seus cuidados e se preocupa, mesmo quando este não entende; por isso usa de misericórdia, e quer que os seus filhos usem também, mais que apenas ritos.
•        A misericórdia é a proposta de Deus para restaurar a justiça e a linguagem humana necessita do coração para alcançar a pessoa.

A vinda de Javé é certa como a aurora, ele virá a nós como a chuva, como o aguaceiro que ensopa a terra. Mas o amor do povo é como a neblina da manhã, como o orvalho que logo cedo se evapora.
Se Oséias vivesse hoje provavelmente denunciaria as classes sacerdotais que vendem benefícios, bênçãos e prosperidade. Provavelmente denunciaria o Estado como instrumento de opressão a serviço dos poderosos. Ele provavelmente criticaria o povo por se afastar dos mandamentos de Deus, caindo no hedonismo, no materialismo e na ideologia de prosperar a qualquer preço. Tudo isso nos afasta de Deus.
Hoje existem, dentro da Igreja, aqueles que procuram neutralizar a alienação na qual vivem tantos cristãos, perdidos em práticas e observâncias que já não são expressão de amizade com Deus, mas simples expressão de uma procura de segurança humana. A manutenção rígida dessa situação, tanto na Igreja como na sociedade, não provém só do povo, mas também daqueles que exercem a autoridade. Assim, a crítica profética, ontem como hoje, vai também para aqueles que detêm o poder. Por isso, a missão profética é uma missão perigosa, ontem como hoje, nada agradável para quem dela tomou consciência.
As prostituições sagradas de Oséias não consistem somente em adorar imagens de ídolos, mas também fazer como hoje alianças políticas que provocam dependência, exploração econômica e opressão. Prostituições são também os golpes de estado que preservam interesses de uma pequena minoria e promovem todo tipo de injustiças. Tudo isso nos afasta de Deus.
Nosso tempo, no entanto, ainda comporta o anúncio do amor fiel e misericordioso de Deus para com seu povo. Povo esse que somos todos nós, brancos, negros, amarelos ou mestiços. Basta que este povo se converta e volte a conhecer a Javé.
O conhecimento de Deus não é uma atitude intelectual, mas uma adesão amorosa, através de uma prática que corresponda ao projeto de Deus, o qual nos foi mostrado desde o deserto, por ocasião do Êxodo. Tal prática fará com que Javé receba novamente seu povo como esposa, dispensando-lhe todo o carinho. Essa é a nossa fé e a nossa esperança.
A Igreja Católica comemora o profeta Oséias no dia 4 de julho.

O CEBI Méier começa neste mês o estudo de profetas do Povo de Deus. Estes encontros serão realizados aos sábados, durante o ano presente, das 8:30 às 12 horas, na Casa Padre Dehon.

Livros-texto: “Como ler o Livro de Amós – A Denúncia da Injustiça Social”, Euclides M. Balancin & Ivo Storniolo, coleção Como Ler a Bíblia, Editora Paulus, 5ª edição, S.Paulo, 2011; “Como ler o Livro de Oséias – Reconstruir a Casa”, Enilda de Paula Pedro & Shigeyuki Nakanose, coleção Como ler a Bíblia, Editora Paulus, 1ª edição, S.Paulo, 1995.

Programação para junho:


29/06 Monarquia e Profetismo – Curso Popular da Bíblia.

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