CEBI MÉIER
Comunidade Renato
Cadore
O Livro de Amós: A Denúncia da Injustiça Social.
Fernando Henriques
coordenador
“Eu não sou profeta, nem discípulo de profeta. Eu sou criador de gado e cultivador de sicômoros. Foi Javé quem me tirou de trás do rebanho, e me ordenou: Vá profetizar a meu povo Israel” (Amós 7, 14b-15).
O Livro
de Amós é uma grande denúncia da injustiça social. Além disso, é uma crítica à
religião que serve de fachada para a injustiça, que acoberta um sistema social
iníquo e viciado pela raiz. Lendo o Livro de Amós podemos ter uma ideia do
significado e da forma da atividade profética, pois o texto desse profeta é uma
verdadeira introdução ao profetismo, com todos os elementos básicos que
caracterizam os livros proféticos que surgirão posteriormente (Euclides M.
Balancin e Ivo Sorniolo).
A
vocação profética de Amós chama a nossa atenção para a liberdade de Deus, que
escolhe seus enviados onde ele quer e não apenas onde esperaríamos que
escolhesse. Isso mostra a importância de estarmos atentos para ver onde está se
manifestando a voz da profecia. A voz que se pretende profética é sempre uma
voz libertadora, que desvenda a realidade e aponta caminhos para que o povo
tenha mais vida. Tanto sua denúncia como seu anúncio libertam o povo das
amarras de uma realidade que o oprime, para construir novos passos na história
em direção a uma sociedade mais justa.
Como
base para sua crítica profética, Amós recorreu ao acontecimento fundante do
povo de Israel: a libertação da escravidão para formar uma nova sociedade em
aliança com o Deus justo. Amós denuncia que Israel se esquecera de sua própria
história, renegando os valores de esperança e libertação. Não se tratava de
mero erro, grande ou pequeno, mas de clara involução. A crítica de Amós,
portanto não exige uma reforma qualquer, mas uma retomada fundamental da
própria história, produzindo uma conversão no presente ao projeto de Javé.
O
cerne de todas as críticas de Amós pode ser resumido num só ponto: a perversão
de uma religião que na origem é essencialmente libertadora, para transformá-la
em instrumento de opressão. O profeta articula a Palavra de Deus para desmontar
essa ordem injusta e trazer novamente a esperança para o povo. Sua firmeza e
confiança repousam apenas na certeza que ele percebe através dos grandes atos
de Deus na história.
O
texto final do livro de Amós (9,11-15) é um acréscimo feito muito tempo depois
e se dirige aos judeus exilados na Babilônia. Esse texto final abre
perspectivas de esperança para aqueles que foram castigados com o exílio e
reconheceram a própria culpa. Redescobre a possibilidade do Dia de Javé como
Dia de Luz para todo o povo.
***
Livro
de Oséias: Palavra de Javé que foi dirigida a Oséias, filho de Beeri, nos dias
de Ozias, Joatão, Acaz e Ezequias, reis de Judá, e nos dias de Jeroboão, filho
de Joás, rei de Israel. O século VIII a.C. impressiona pela acumulação, no
breve espaço de tempo de meio século, de quatro profetas de grande calibre:
Amós, Oséias, Isaías e Miquéias.
No
movimento profético temos duas fortes correntes, a israelita e a judaíta. A
corrente judaíta apresenta sacerdotes críticos ao Estado (Isaías e Ezequiel). A
corrente israelita é mais camponesa e revolucionária (Samuel, Elias, Eliseu,
Miquéias, Amós, Oséias, Jeremias).
O
Profeta Oséias é do Reino do Norte (Israel) e profetiza entre os anos de 743 e
732 a.C. O nome Oséias significa Deus
Salva. Oséias chamará poeticamente o Reino de Israel de Efraim. Ele sucede
Amós, após este ter sido expulso do Reino do Norte. Israel possuía à época dois
grandes santuários: Betel e Garizim. Foi um período de muitos conflitos
internos, ao mesmo tempo em que a profecia cresceu como voz dos espoliados. O
Reino de Israel vivia seus últimos anos de independência, pois Samaria, a
capital, seria tomada pelos assírios em 722 a. C.
A
juventude de Oséias coincidiu com um dos poucos momentos de prosperidade do
Reino do Norte. Entretanto essa situação mudou completamente após a morte do
rei Jeroboão II (783-743 a.C.). O Reino de Israel decaiu rapidamente devido ao
expansionismo do Império Assírio, à fragilidade do poder central e às suas
contradições internas. Nunca mais haverá um Reino de Israel.
Oséias
é o profeta que sente “as dores do fim” e dará uma certa continuidade à
profecia de Amós, acentuando a necessidade de restaurar o culto e a função do
templo de Betel como um lugar do verdadeiro culto a Javé.
A
não ser que não se trate só de uma parábola, Oséias viveu um drama em sua vida
conjugal: a infidelidade da esposa, que se desviou para a prostituição. Apesar
disso, o marido continuou a amá-la, e, convertida, acolheu-a novamente. O amor
de Oséias, assim fiel e desinteressado, despertou a mulher para o seu valor e
ela voltou a ser a esposa. Com isso, Oséias descobriu ser ele dono da força
regeneradora do amor. Esta marcante experiência abriu os olhos do profeta para
a tragédia de seu povo: amado por Deus, mas infiel. Oséias será o profeta da
fidelidade amorosa à Aliança.
O
tema central do profeta será claro e preciso: o amor de Deus e o pecado de
Israel. O cerne da mensagem de Oséias sustenta que Deus quer Amor e
Misericórdia e não sacrifícios. Trata-se de uma virulenta denúncia contra as
elites que promoviam a violência e viviam à custa do sangue do povo oprimido,
explorando até a sua fé em Deus. A instituição sacerdotal em Betel é
diretamente acusada pela profecia de Oséias. Os sacerdotes são especialmente
acusados de não instruir o povo, facilitando com que se afastem da Aliança com
Javé. De uma certa maneira a classe sacerdotal era reforçada com a
multiplicação dos pecados, pois isto também significava mais gastos em
sacrifícios. O afastamento do povo de Javé é apresentado pelo profeta como
prostituição.
Dentro
da dinâmica da Aliança e da necessidade de reatar relações, se poderia resumir
a teologia de Oséias nos seguintes pontos:
• Javé pede divórcio em virtude da
corrupção dos líderes religiosos e políticos e se retira de sua presença.
• Reis e sacerdotes são culpados pela
situação do povo.
• As injustiças sociais ferem o povo e
rompem a Aliança.
• Deus é mãe que alimenta o filho, que tem
seus cuidados e se preocupa, mesmo quando este não entende; por isso usa de
misericórdia, e quer que os seus filhos usem também, mais que apenas ritos.
• A misericórdia é a proposta de Deus para
restaurar a justiça e a linguagem humana necessita do coração para alcançar a
pessoa.
A
vinda de Javé é certa como a aurora, ele virá a nós como a chuva, como o
aguaceiro que ensopa a terra. Mas o amor do povo é como a neblina da manhã,
como o orvalho que logo cedo se evapora.
Se
Oséias vivesse hoje provavelmente denunciaria as classes sacerdotais que vendem
benefícios, bênçãos e prosperidade. Provavelmente denunciaria o Estado como
instrumento de opressão a serviço dos poderosos. Ele provavelmente criticaria o
povo por se afastar dos mandamentos de Deus, caindo no hedonismo, no
materialismo e na ideologia de prosperar a qualquer preço. Tudo isso nos afasta
de Deus.
Hoje
existem, dentro da Igreja, aqueles que procuram neutralizar a alienação na qual
vivem tantos cristãos, perdidos em práticas e observâncias que já não são
expressão de amizade com Deus, mas simples expressão de uma procura de
segurança humana. A manutenção rígida dessa situação, tanto na Igreja como na
sociedade, não provém só do povo, mas também daqueles que exercem a autoridade.
Assim, a crítica profética, ontem como hoje, vai também para aqueles que detêm
o poder. Por isso, a missão profética é uma missão perigosa, ontem como hoje,
nada agradável para quem dela tomou consciência.
As
prostituições sagradas de Oséias não consistem somente em adorar imagens de
ídolos, mas também fazer como hoje alianças políticas que provocam dependência,
exploração econômica e opressão. Prostituições são também os golpes de estado
que preservam interesses de uma pequena minoria e promovem todo tipo de
injustiças. Tudo isso nos afasta de Deus.
Nosso
tempo, no entanto, ainda comporta o anúncio do amor fiel e misericordioso de
Deus para com seu povo. Povo esse que somos todos nós, brancos, negros,
amarelos ou mestiços. Basta que este povo se converta e volte a conhecer a
Javé.
O
conhecimento de Deus não é uma atitude intelectual, mas uma adesão amorosa,
através de uma prática que corresponda ao projeto de Deus, o qual nos foi
mostrado desde o deserto, por ocasião do Êxodo. Tal prática fará com que Javé
receba novamente seu povo como esposa, dispensando-lhe todo o carinho. Essa é a
nossa fé e a nossa esperança.
A Igreja Católica comemora o
profeta Oséias no dia 4 de julho.
O CEBI
Méier começa neste mês o estudo de profetas do Povo de Deus. Estes encontros
serão realizados aos sábados, durante o ano presente, das 8:30 às 12 horas, na
Casa Padre Dehon.
Livros-texto: “Como ler o Livro de Amós – A Denúncia da Injustiça
Social”, Euclides M. Balancin & Ivo Storniolo, coleção Como Ler a Bíblia,
Editora Paulus, 5ª edição, S.Paulo, 2011; “Como ler o Livro de Oséias –
Reconstruir a Casa”, Enilda de Paula Pedro & Shigeyuki Nakanose, coleção
Como ler a Bíblia, Editora Paulus, 1ª edição, S.Paulo, 1995.
Programação para junho:
29/06 Monarquia e Profetismo – Curso
Popular da Bíblia.
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