segunda-feira, 15 de maio de 2017

Quem é meu companheiro?

Companheirismo, quem é meu companheiro?
João Crispim Victorio[i]
Recentemente fui chamado de companheiro por uma pessoa que julgo não saber o significado da palavra. Pois tenho observado que muitos vêm, ao longo dos últimos anos, utilizando o termo pura e simplesmente por modismo ou de forma incoerente com o seu verdadeiro sentido e significado. Dessa forma, podemos dizer que o termo companheiro vem sendo usado de modo genérico para identificar pessoas como pertencentes a um determinado grupo organizado, que pode ser partidário, sindical, religioso, cultural ou esportivo, independentemente da superficialidade ou do comprometimento de cada um no grupo.
A etimologia da palavra companheiro[1] deriva da tradução do latim vulgar (‘cum’ + ‘panis’), na antiga Gália - atual França, de uma expressão germânica, "gahlaiba", composta de “ga” («com») + “hlaiba” («pão») – cf. Dicionário Houaiss, e do antigo castelhano compañero. Segundo, Antenor de Veras Nascentes[2]o signficado no latim vulgar compania `conjunto de pessoas que comem seu pão juntamente´ ter-se-ia generalizado para `pessoas que vão juntas´ e, depois, se especializado, como termo militar e para fazer referência à `tripulação de uma embarcação´”.
Como podemos ver a palavra companheiro que se referia a quem se comia junto o pão, foi perdendo seu significado. Hoje o sentido da palavra companheiro se confunde com o da palavra colega, conforme definição do Dicionário Aurélio[3] “1 aquele ou aquilo que acompanha ou que faz companhia. 2 - O que vive na mesma casa. 3 - Pessoa que partilha com outra(s) a profissão, as mesmas funções, a mesma coletividade. 4 - Pessoa que tem com outra ou outras uma relação de amizade ou camaradagem. 5 - Membro de um casal, relativamente ao outro. 6 - Segundo grau da ordem. 7 - Forma de tratamento amigável. 8 - Que acompanha ou faz companhia. 9 - Que anda junto. 10 - Que está sempre ligado a outro”.
Na origem, companheiro é alguém muito próximo que senta à mesa conosco para partilhar o pouco pão e compartilhar a luta por uma vida melhor. Assim nasceram as primeiras organizações operárias - os sindicatos[4]. A solidariedade entre os operários e suas famílias foi de fundamental importância na conquista de melhores salários, melhores condições de trabalho e fortalecimento de classe. Desse modo, companheirismo é um processo coletivo de construção ideológico no intuito de abraçar o ideal da transformação social “para que todos tenham vida, e a tenham em abundância[5]”, que significa ter casa, escola, trabalho, saúde e pão para comer, pão que historicamente é símbolo de acolhida e de solidarismo[6].
Mas, infelizmente, alguns dos que se dizem companheiros, principalmente os que atuam com você nos sindicatos e nos partidos políticos, os que deveriam ter um mínimo de ideologia e saber que vivemos uma luta de classes, justamente esses agem sem nenhum escrúpulo e usam os outros companheiros para atingir seus objetivos escusos. Isso mos mostra a triste realidade da atual sociedade que vivemos. Então, é preciso recuperar os valores éticos, morais e solidários, que vêm sendo aos poucos ignorados e banalizados pelo poder opressor, desse sistema político capitalista que valoriza o individualismo, a vaidade e o consumismo em detrimento do companheirismo e da vida em plenitude.


Rio de Janeiro, 11 de maio de 2017.



[1] Disponível em: https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/a-etimologia-de-companheiro/33460. Acesso em: 11 de Maio de 2017.

[2] Antenor de Veras Nascentes (6/1886 – 9/1972) filólogo, etimólogo, dialectólogo, e lexicógrafo brasileiro de grande importância para o estudo da lingua portuguesa. É considerado um dos mais importantes estudiosos da Língua Portuguesa do Brasil no século XX. Ocupou, como fundador, a Cadeira nº 3 da Academia Brasileira de Filologia.

[3] Disponível em: ‹https://dicionariodoaurelio.com/companheiro›. Acesso em: 11 de Maio de 2017.

[4] Disponível em: http://www.esquerdadiario.com.br/Origem-da-palavra-companheiro. Acesso em: 11 de Maio de 2017.

[5]  Disponível em: https://www.bibliaonline.com.br/acf/jo/10/10. Acesso em: 11 de Maio de 2017.

[6] Termo criado pelo autor.




[i] Professor, Especialista em Educação, Poeta e Secretário do CEBI-RJ.

Eu vi a coragem do Povo e a repressão praticada por aqueles que deveriam cuidar da “ordem”.

           Na  última sexta, dia 28 de abril, data escolhida para a greve geral e atos contra as reformas trabalhista e previdenciária que o governo quer nos impor. Precisávamos (eu e Milena, uma de minhas filhas), como de costume, estar junto às ansiedades e caminhada do povo e a este evento marcante para os novos rumos da história brasileira.
De início fomos à Cinelândia, onde concentravam-se centrais sindicais e várias categorias sindicais, entre elas:  saúde, petroleira, educação, químicos etc. Encontrava-se também a postos um cordão  da tropa de choque da PMRJ, prontamente equipada com escudos, bombas e cassetetes, na entrada principal do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, a fim de inibir o acesso dos manifestantes às escadarias deste. Observamos toda a  movimentação  e dali  partimos  em direção à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro  (ALERJ), um dos principais pontos de encontro da atual luta popular. Onde também já encontrava-se a postos, no alto das escadarias, mais um cordão da PMRJ.
               Lá já estava concentrada uma multidão, e partimos em direção à igreja da Candelária. Logo fomos surpreendidos pelo estouro de bombas e gás lacrimogênio (gás de pimenta) que partiam da parte posterior à multidão. Os manifestantes mais próximos e atingidos pelo gás comprimiam-se em meio à multidão e a cortina de fumaça na tentativa de alcançar a primeira esquina  para se proteger.  Dentre a multidão, havia famílias com crianças, idosos e idosas, universitários, jornalistas e centenas de trabalhadores e trabalhadoras. 
Recuperadas dos efeitos dos gases, juntamente com outras pessoas, retornamos à multidão. Chegamos  à Igreja da Candelária, e numa mureta, filmamos parte da multidão, quando visualizamos os “mascarados” adentrando na avenida, com arruaças e quebra-quebra, migrando para o lado direito da mesma Avenida, destruindo  vidraças de uma agência bancária, ao passo que a multidão seguia sua trajetória com palavras de ordem atrás do carro de som, pelo lado esquerdo desta mesma Avenida. Ao cruzar a lateral da igreja da Candelária, havia um novo cordão da PMRJ na espera, que observavam de longe a ação dos mascarados. Helicópteros apareceram sobrevoando a região.  Adiante, havia inesperadamente mais um cordão da PMRJ que logo avançou em direção à multidão novamente com bombas de gás e também com tiros de borracha. Iniciou-se então novo enfrentamento e correria.
O intrigante deste momento, foi que mesmo o grupo de mascarados efetuando suas ações do lado direito da Avenida Pres. Vargas, toda a investida policial, concentrou-se do lado esquerdo, onde passavam os manifestantes pacificamente.
               Houve muita correria e dispersão dos manifestantes e em meio  ao corre-corre e ação do gás, pessoas passaram mal. Correndo, entramos na Rua Uruguaiana, abrigando-nos em uma lanchonete, a qual estava fechando as portas devido à cortina de fumaça. Permanecemos lá por mais ou menos 30 minutos,  junto a um grupo de universitários vindos da cidade de Rio das Ostras. Nesta  lanchonete, assistimos algumas transmissões ao vivo de uma “grande emissora de televisão brasileira”, que divulgava imagens distorcidas sobre o fato ocorrido.
             É nítida a inversão de valores, a insistência na apresentação de imagens que são favoráveis ao que eles querem que acreditemos. São  mentiras descaradas.
             Logo seguimos em direção para o Largo da Carioca, onde tinham novos cercos policiais restringindo as passagens de acesso à Cinelândia e nitidamente ouviam-se estouros de bombas vindos de lá. Contornamos pela Av. Chile, na esperança de chegarmos e continuarmos a manifestação. 




Na Rua das Marrecas,  muitos grupos dispersos, que vinham retornando da Cinelândia devido à violência instaurada pela PMRJ, e insistentemente helicópteros sobrevoavam em baixa altura ruidosamente.
Recomeçam os tiros cada vez mais próximos e decidimos retornar para casa.   Observamos ainda, mais policiais saindo do Quartel General com seus blindados da Rua Evaristo da Veiga indo em direção à Cinelândia.
No caminho de volta para casa, vínhamos refletindo sobre a coragem do povo, abafada pela covardia e repressão dos Poderes do Estado. Mesmo tristes, cada cidadã e cidadão tinham exercido seu direito de ir às ruas em busca de melhores dias e  a certeza de que a multidão  que cumpriu seu papel e que foi violentada, se recuperará e retomará o que é seu por direito.

                                                         Janete J. Martins
                                                         CEBI RJ