LINGUAGEM APOCALÍPTICA
Extensivo CEBI
RJ - 12 de abril de 2015 - Janete Julio Martins - CEBI Caxias
LINGUAGEM
APOCALÍPTICA
O TERMO APOCALIPSE
Apo-calipse é uma palavra grega que tem um sentido positivo. Significa literalmente
re-velação, tirar o véu, descobrimento. Ao tirar o
véu que encobre os acontecimentos, o apocalipse clareia o caminho e faz crescer
a esperança.
Às vezes se
diz “Temos que ser profetas!” Ninguém diz “Temos que ser apocalípticos!”
Pelo contrário, em tempos ditos apocalípticos, até as lideranças
costumam reagir com uma atitude de defesa. Buscam maior disciplina para manter
fora de casa os ares aparentemente confusos e incômodos do movimento
apocalíptico. Mesmo assim, o movimento pentecostal-apocalíptico cresce. Tanto
ontem como hoje, ele tem a ver com o movimento popular. Cresce em toda parte, sobretudo entre os mais pobres e
marginalizados. Assim acontecia no fim do séc.I.
PROFECIA E APOCALIPSE
O movimento profético nasceu da
experiência de se poder fazer algo para
conduzir os fatos da história de acordo com o projeto de Deus, Diante de
determinadas situações, percebia –se que podia fazer algo para transformá-la,
então nascia um sentimento de responsabilidade, surgia uma vocação. O movimento
profético surgiu num contexto em que era
possível abarcar a situação, onde tentavam viver a Aliança , mesmo em duas
direções opostas: o profeta oficial ( do rei), que identificava o projeto de Deus com o projeto monarquia, e
o profeta popular, que identificava o projeto de Deus com os direitos
desprezados dos pobres.
Para os antigos profetas
populares, o Dia de Javé realizava-se e manifestava-se em acontecimentos históricos
no decorrer dos anos e dos séculos ( Ex
14,30-31 ; IRs 17,1 ; Lm 2,1-3.22
e 1,12).
O movimento apocalíptico
nasce do lado de quem sofre a história e não ao lado de quem a conduz.
Verbaliza a experiência dos pobres e oprimidos que não tem poder e que, apesar
de sua impotência diante do rolo compressor do império, não se entregam nem
perdem a esperança. O movimento apocalíptico surge do lado de quem está
perdido, mas quer continuar a crer. Nasce de dentro do medo do caos como
tentativa de manter a fé no Deus dos pais e dos profetas. Para o apocalíptico,
os opressores do povo, por mais que gritem e explorem, já perderam! Mesmo que
por algum tempo, o povo ainda deva continuar a sofrer. As coisas vão mudar,
porque “Deus é o Senhor”.
Para expressar essa fé,
os apocalípticos inventam novas formas que, muitas vezes, são heterodoxas ou
heréticas para a elite. Mas são formas que os excluídos encontram para não se
perder e poder sobreviver. Em seus escritos, em formas literárias variadas,
reaparece quase sempre o mesmo esquema de pensamento, o mesmo quadro
visionário, cujo eixo principal é a espera da chegada do Dia de Javé.
Assim pouco a pouco, o
enfoque vai mudando. Para os apocalípticos, o Dia de Javé continua sendo o
dia da justiça divina, mas já não contra o rei infiel de Israel, e sim contra
as nações que oprimem e exploram o povo de Deus. Os sinais cósmicos que o
acompanham simbolizam a chegada desse fim. Eles prefiguram a desintegração da
antiga criação e o começo da nova criação ( Ap 20,11 a 21,5).
O profeta que despreza o apocalíptico já não sabe
o que é profecia. O apocalíptico que despreza o profeta deixou de ser ele mesmo
uma revelação (apocalipse) de Deus para o povo. ( Afirmações a partir de estudos
populares realizados)
Nesta linguagem encontramos expressão legítima da fé em Deus, que é senhor e soberano da história. Ela
mantinha a esperança quando tudo parecia sem esperança, afirmando que Deus
governa e governará no Dia do Juízo, no fim da história. É uma literatura subversiva, que gozou de uma
enorme popularidade, que quer incentivar seus destinatários à lealdade
e à fidelidade na luta contra o “reino do império”, em busca de uma
alternativa, o “Reino de Deus”.
A apocalíptica é a
esperança que brota da angústia de grupos fortemente oprimidos em meio a
impérios tiranos. O gênero apocalíptico,
surgido nessas situações limite, foi
então a maneira como se formulou a profecia. A profecia não se opõe à
apocalíptica, mas é um novo gênero literário para formular a profecia. (Ildo
Bonh Gass,Época Dominação Grega)
O
MOVIMENTO APOCALIPTICO NA LINHA DO TEMPO
Entre o século III a. C.
e o século II d.C., o movimento apocalíptico produziu uma ampla literatura,
maior talvez que a literatura profética. Tanto os cristãos como os judeus
produziram apocalipses, mas só dois deles entraram na lista dos livros
inspirados: o de Daniel e o de João.
a.
Época persa, 538-333 a.C. – Aos poucos a profecia vai encontrando novas
formas de expressão. A transmissão ampliada das visões e profecias de Ezequiel,
Joel, Zacarias 9-14, Isaías 24-27 e Isaías 34-35, contribui para que aos
poucos, se crie um ambiente que vai gerar o movimento apocalíptico.
b.
Época helenista, 333-63 a.C. – Por causa da politicagem e da corrupção,
ganância de poder e de dinheiro, a explosão acontece no início do sec.II
durante o governo do rei selêucida Antíoco IV, o que provoca a revolta armada
doa Macabeus e mais tarde a nomeação de Jônatas ( não era de família
sacerdotal) provoca violenta reação do povo. A partir desses
acontecimentos as ideias apocalípticas
se espalham entre as camadas mais pobres e oprimidas do povo. Provavelmente, o
início da tradição oral apocalíptica tenha começado no fim do período
helenista. A redação por escrito da maior parte dessa literatura se faz durante
o período romano.
c.
Época romana, 63 a.C.-135 d.C. – Além
dos livros de Daniel, dos Jubileus, do 3º Livro de Esdras e dos segredos de
Henoc, podem ser assinalados os seguintes livros de inspiração apocalíptica
escritos no período romano: O Testamento dos
Doze Patriarcas, o 4º Livro de Esdras, o Apocalipse de Baruque, o
Testamento de Jó, o Testamento de Abraão, a Ascensão de Isaías, o Apocalipse de
Abraão, o Apocalipse de Elias, o Apocalipse de Moisés, o Apocalipse de Henoc.
Esses escritos da tradição judaica eram muito lidos tanto no ambiente judaico
como no ambiente cristão.
No período entre 70 e 135 d.C., o movimento
apocalíptico alcança o seu ponto mais alto nas
comunidades cristãs. Além da literatura já mencionada, surgem entre os cristãos
o Apocalipse de João, o Apocalipse de Pedro e o Apocalipse de Paulo.
A não ser os apocalipses de Daniel e de João,
nenhum dos outros escritos entrou na lista dos livros inspirados, nem dos
judeus nem dos cristãos. É que para a elite sacerdotal e intelectual, tanto dos
cristãos como dos judeus, tais livros continham elementos heterodoxos e
heréticos. A elite não foi capaz de compreender a expressão popular da fé que
muitas vezes surgia em oposição à organização centralizada. Além disso, a reserva com relação aos
escritos apocalípticos também tem a ver com os reais perigos e limites
inerentes ao movimento apocalíptico.
LIMITES
E PERIGOS INERENTES AO MOVIMENTO APOCALÍPTICO
Na Bíblia aparecem
vários limites e perigos que afetam o movimento apocalíptico e explicam sua
ambiguidade:
a.
Perigo do fundamentalismo – Nem sempre o vidente entende a missão que
recebe ( Ap 7,14 ; Dn 8,15). A obscuridade das visões e o extremismo das
pessoas trazem consigo o perigo do fundamentalismo, que interpreta ao pé da
letra. O fundamentalismo é uma grande tentação que em épocas de incerteza e de
insegurança, se instala na mente de muita gente. Ele separa o texto da vida e
da história do povo e absolutiza como
única manifestação a Palavra de Deus. A vida,
a história do povo, a comunidade já não teriam mais nada a dizer sobre
Deus e sua Vontade. É a ausência total de consciência crítica. O
fundamentalismo distorce o sentido da Bíblia e, na sua interpretação, alimenta
o moralismo, o individualismo e o espiritualismo. É uma visão alienada que
agrada aos opressores, pois impede que os oprimidos tomem consciência da
iniquidade do sistema montado e mantido pelos poderosos. Ao recusar o
pensamento crítico e o bom senso, o fundamentalismo pode transformar-se em
causa de tragédias. Por exemplo, durante o cerco de Jerusalém, no ano 70 d.C.,
grupos apocalípticos lutavam entre si, exterminando-se mutuamente. Depois da
destruição de Jerusalém, os sobreviventes cometeram suicídio coletivo em
Massada. Ainda recentemente,
tivemos suicídio coletivo de vários
grupos fundamentalistas.
b.
Perigo de imobilismo e fatalismo – O movimento apocalíptico ensina e sugere que o
Plano da Salvação já está pronto e definido e que não é necessária a
contribuição humana. Por isso corre o risco de alimentar o fatalismo que impede
ou desaconselha a participação das pessoas. Assim, na comunidade de
Tessalônica, muitos cruzavam os braços e ficavam em cima do muro, sem
comprometer-se (2Ts 3,11). O mesmo fazem hoje, quando recusam ou condenam a
participação social e política.
c.
Perigo de isolamento – O movimento apocalíptico ensina e sugere que
os pobres, perseguidos e ameaçados pelo império, são o povo eleito de Deus a
ser salvo no Dia de Javé. Por isso, esse “povo eleito” corre o
perigo de considerar-se um “povo privilegiado”, os únicos eleitos a serem
salvos. Eles se isolam no seu privilégio e tratam os outros com desprezo. Os
outros seriam uns pobres condenados. Em
vez de difundir o Reino, eles fazem proselitismo. Essa atitude transparece nos
discípulos, depois da ascensão de Jesus. Ficam olhando para o céu, esquecendo a
missão de anúncio (At 1,11). Em Atos 1,7-8, a recomendação é esta: “Deixe na
mão de Deus a preocupação com o fim do mundo, e vai pelo mundo para dar
testemunho do Evangelho!”
d.
Ambiguidade, medo e manipulação – A experiência de Deus tem certa ambiguidade.
De um lado, ela é mistério fascinante que atrai. De outro, é mistério tremendo
que causa medo. Quando essa experiência se faz presente no meio das visões
apocalípticas de catástrofes, então o medo cresce e prevalece. Muita gente,
inclusive Daniel (Dn 7,15; 8,17) e João (Ap 1,17), ficam com medo diante de
certas visões. E o medo de ser atingido pelas pragas, destinada aos opressores.
Há pessoas que usam esses textos para suscitar medo nos pobres. Manipulam as
visões apocalípticas para dominar as consciências mediante a ameaça de castigo.
Mas Deus, sem cessar, manda repetir o apelo;”Não tenham medo!” (Ap 1,17), “Não
chore!” (Ap 5,5). ( Afirmações a partir de estudos populares
realizados)
)
OBSERVAÇÃO
No Segundo
Testamento há também vários textos apocalípticos, como os de Jesus, que vence
as tentações (Lc 4,1-13 e paralelos), o da transfiguração (Mt 17,11-8 e
paralelos), o do rico e Lázaro (Lc 16,19-31), o da grande tribulação e da
parusia (Mc 13,14-27), o do discurso de Mt 24-25 e sobre a destruição do
Templo, o fim dos tempos e o juízo final, e outros. (Milani;
Passos; Vasconcellos e Villac, 2007).