domingo, 24 de novembro de 2013

Povo brasileiro foi às ruas gritar suas demandas. Fernando Henriques - CEBI Méier

CEBI MÉIER - Comunidade Renato Cadore


Povo brasileiro foi às ruas gritar suas demandas.
Fernando Henriques
coordenador


Brasília foi palco da abertura da Copa das Confederações. A presidenta Dilma e o presidente da FIFA foram mimoseados com uma solene vaia da classe média presente. Pobre no Brasil não pode mais ir aos estádios. Melhor dizendo, não pode ir às Arenas, nome da moda.
   O Brasil tem de volta o velho Felipão. A Família Scolari mais uma vez deu o ar de sua graça. Tendo em mãos uma grande geração de atacantes e uma defesa sólida como poucas em nossa história, o veterano treinador montou uma equipe competitiva e que até joga bonito de vez em quando. A poderosa Espanha não foi suficiente para parar o escrete canarinho. E Neymar já desponta como podendo vir a ser um de nossos maiores jogadores de todos os tempos, da estirpe de Zico, Pelé e Leônidas da Silva.
A Copa das Confederações é um aperitivo da Copa do Mundo. Não mais do que isso. Serve também para se testar a organização e o equipamento esportivo, ao menos parcialmente. Por isso é bom não superestimar a conquista. O Brasil já venceu antes e perdeu a Copa. Na verdade, até hoje, nenhuma seleção venceu a Copa das Confederações e a Copa do Mundo no ano seguinte. Cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém.
    Na época da ditadura militar a ARENA era o partido que dava sustentação ao regime autoritário. Na Roma antiga, arena era um local onde os leões se punham a comer os cristãos e não só. Modernamente arenas são essa mistura de estádio, espaço de shows e eventos, e shopping center em que foram transformados os campos de futebol. Muita sofisticação e pouco respeito pelo povão que era o grande frequentador de locais como a geral do Maracanã. O profissionalismo exacerbado e o chamado padrão FIFA ainda vão matar o nosso tão querido futebol.
   O futebol evoluía nos estádios e o povo protestava nas ruas. A partir de São Paulo e espalhando-se pelo Rio de Janeiro e pelo restante do país, tomou forma o protesto do MPL (Movimento Passe Livre), o qual parte do pressuposto que se falamos em saúde pública e em educação pública, também deveríamos falar em transporte público. Um transporte de massa de qualidade e que não tenha de ser pago pelo cidadão. Há diversos casos espalhados pelo mundo em que se cobra tarifa zero. Em São Paulo, anos atrás, a gestão PT (Luiza Erundina) da capital bandeirante tentou sem sucesso implantar o sistema. O MPL foi fundado em 2005 durante o Fórum Social Mundial capitalizando a chamada Revolta da Catraca em Florianópolis no ano anterior.
   O motivo imediato das atuais manifestações foi o aumento das tarifas de ônibus, trens e metrô na capital paulista: aumento de 20 centavos (de 3,00 para 3,20 reais). Mesmo aumento de ônibus no Rio de Janeiro (de 2,75 para 2,95 reais), onde já se havia registrado um aumento ainda mais salgado nas barcas e no metrô.
   Seguindo os métodos de convocação da chamada Primavera Árabe e de movimentos na Espanha e nos Estados Unidos, os jovens estudantes do MPL passaram a convocar grandes manifestações pelas redes sociais, a primeira delas em São Paulo, a 11 de junho, logo seguidas por manifestações no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Fortaleza e inúmeras outras capitais e cidades do interior, derramando-se por mais de 400 municípios. A resposta positiva à convocação pegou de surpresa a classe política, a mídia e a maioria do povo. Dia 13 de junho, Dia de Santo Antônio, um milhão de pessoas foram às ruas e desfilaram pela avenida Presidente Vargas, da Candelária até a sede da Prefeitura na Cidade Nova.
   É preciso notar que o MPL é apartidário, mas não antipartidário como certa facção da mídia tentou fazer crer. Na verdade, desde o início do movimento ele contou com a juventude do PSOL, PSTU, PCO e vários outros, além dos anarquistas. Já as estruturas partidárias demoraram cerca de 10 dias a se posicionar, inclusive a do PT. À medida que o movimento se expandiu foram sendo agregados feministas, gays, punks, juventude de igrejas diversas, cicloativistas, inimigos dos automóveis,black blocs e um sem número de outros tipos nem sempre bem rotulados.
   Depois de alguma hesitação, os governos recuaram e cancelaram o aumento dos transportes públicos, esperando assim esvaziar o movimento. Não foi bem assim. Logo foram surgindo outros gritos de luta. As demandas por melhor educação, melhores transportes, melhor cuidado com a saúde foram somadas a reivindicações de reforma política e contra a PEC 37 (Proposta de Emenda à Constituição) que retirava do MP (Ministério Público) o direito de investigação.
   O fator aglutinador do movimento depois da quebra da bandeira das tarifas talvez tenha sido a truculência da Polícia Militar na repressão ao movimento. Enviar contra manifestantes exercendo a sua cidadania uma tropa de choque, treinada para enfrentar as poderosas e bem armadas quadrilhas do narcotráfico, pode não ter sido a melhor decisão. Trouxe de novo à discussão a necessidade de se desmilitarizar a polícia, por enquanto um pequeno eco em meio à gritaria. Muitos jornalistas foram espancados e presos acusados de formação de quadrilha entre outros delitos. O que só atesta o despreparo da polícia em lidar com um suposto levante popular.
   A televisão e os jornais pareceram também surpresos com a magnitude dos protestos. De início restringindo-se a informar os incômodos que resultavam para o trânsito das cidades, logo perceberam o fato novo e associaram-se à agenda da direita política que tentava empolgar o apelo das ruas com demandas essencialmente conservadoras e até mesmo irresponsáveis namorando o golpismo institucional. Apareceram bandeiras a favor das privatizações e exigindo redução de impostos.
   A imprensa passou a mostrar a ação de radicais no interior do movimento, rotulados como vândalos, e a separar esses elementos da maioria pacífica dos manifestantes. Ônibus, agências bancárias e mobiliário urbano foram os principais alvos. Mas quem eram esses vândalos? Muitos eram simplesmente manifestantes extremados, mas não se pode descartar a infiltração de grupos interessados na desestabilização da vida pública.
   Uma turma de oportunistas operando no limite da marginalidade percebeu a oportunidade e os saques de lojas começaram.
   O governo federal, com algum atraso, passou à ofensiva tentando encampar a hipótese da reforma política. A presidenta Dilma Rousseff propôs um plebiscito sobre o assunto, mas alguns constitucionalistas viram logo uma impossibilidade jurídica na proposta.
   O Congresso Nacional, atacado diretamente pelos manifestantes em Brasília também se viu obrigado a uma tomada de posição, desengavetando inúmeros projetos de cunho social que estavam esquecidos. E a votação da PEC resguardou o direito investigativo do MP. Alguns renomados juristas apontavam flagrante inconstitucionalidade da proposta e uma nova batalha no STF (Supremo Tribunal Federal). Desta vez não foi preciso chegar a tanto.
   Por fim, a ação de vândalos (radicais e oportunistas) tornou-se tão problemática que o MPL resolveu sair das ruas e não convocar mais manifestações. Entretanto elas ainda tiveram fôlego para mais passeatas. Com o tempo houve o natural refluxo.  
   Uma das demandas que as ruas colocaram foram os gastos com os estádios para a Copa do Mundo 2014. Realizar a Copa, que parecia ser uma unanimidade nacional, mostrou que contava com muitos opositores nas ruas. Algumas das manifestações foram em direção aos palcos dos jogos da Copa das Confederações.
   Outra constatação: é cada vez maior o número de pessoas que não se reconhecem representadas no sistema eleitoral vigente. Muitas instituições perderam prestígio, como o Executivo, o Legislativo e até o Judiciário, além dos partidos políticos.
   As manifestações brasileiras diferem de outras pelo mundo a fora. Aqui não há crise política e nem econômica. Os doze anos de governo petista reduziram dramaticamente os índices de pobreza, a massa salarial aumentou, estamos próximos do pleno emprego. As ruas parecem dizer que isso não basta. O exemplo provavelmente mais próximo são as manifestações em Istambul, na Turquia.
   Fato político relevante: as primeiras pesquisas realizadas após os acontecimentos mostram acentuada queda na aprovação popular de governadores e prefeitos. E também do governo federal do PT e aliados. E especialmente caiu bruscamente a popularidade da presidenta Dilma Rousseff. As eleições do ano que vem podem não ser as favas contadas que muitos imaginavam ser.
   Por fim os trabalhadores entraram em cena. As principais centrais sindicais convocaram manifestação unitária em todos os cantos do país. No Rio de Janeiro, cerca de dez mil trabalhadores tomaram a Avenida Rio Branco, caminhando da Igreja da Candelária até a Praça Floriano, onde se situa a Câmara de Vereadores. A volta dos trabalhadores às ruas talvez tenha sido o fato mais importante de todo este processo.
    Voto não tem preço, mas traz sempre muitas consequências. Ano que vem os brasileiros serão chamados a um importante ato eleitoral. Numa altura em que a cidadania se vê reforçada pelos movimentos das ruas e órgãos como a CNBB e a OAB se empenham em fazer acontecer uma verdadeira reforma política, todos os cristãos são convocados a participar das decisões que afetarão a toda a comunidade.

   O CEBI Méier contempla uma Comissão de Cidadania, Fé e Política. Neste ano que se aproxima será necessário estabelecer os modos de intervenção que possibilitem uma ajuda às pessoas na tomada de decisão a que serão chamadas. Venha trazer sua contribuição, defender suas opiniões e participar dos debates que certamente a Comissão vai organizar.
   O CEBI Méier se reúne todos os sábados (exceto feriados) das 8:30 às 12 horas, na Casa Padre Dehon (Rua Vilela Tavares, 154, Méier). Venha participar das nossas reflexões.  

Programação para novembro/dezembro:

30/11 Curso Popular da Bíblia – monarquia e profetismo.
07/12 Vaticano II – Décimo Encontro – Reversão do Concílio.
14/12 Celebração de Natal.

Obs: Depois estaremos em férias, voltando a partir de março.

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